Por: Carlos Castañeda – O FOGO INTERIOR (livro original)
Adaptação livre de: Frater Goya (Anderson Rosa)
Os Antigos videntes, arriscando-se a perigos inimagináveis, viam realmente a força indescritível que é a fonte de todos os seres sencientes. Chamaram-na de Águia, porque nos pequenos vislumbres que podiam suportar, viam-na como algo que se parecia com uma águia branca e preta, de tamanho infinito.
Viram que é a Águia que concede consciência. A Águia cria os seres sencientes para que estes vivam e enriqueçam a consciência que ela lhes proporciona com a vida. Eles também viram que é a Águia que devora essa mesma consciência enriquecida, depois de fazer com que os seres sencientes a abandonem no momento da morte.
Para os antigos videntes, dizer que a razão da existência é enriquecer a consciência não é uma questão de fé ou de dedução. Eles viram. Eles viram que a consciência dos seres sencientes levanta vôo no momento da morte e flutua como um tufo de algodão luminoso diretamente para o bico da Àguia, onde é consumida. Para os antigos videntes, esta era a evidência de que os sencientes vivem apenas para enriquecer a consciência, que é o alimento da Águia.
A Águia e suas emanações são uma coisa-em-si imutável, que engloba tudo o que existe, do conhecido ao incognoscível. Não há maneira de se descrever em palavras o que são realmente as emanações da Águia. Um vidente precisa testemunhá-las. São uma presença, uma espécie de massa, uma pressão que cria uma sensação de deslumbramento. Só se pode captar um vislumbre delas, assim como só se pode captar um vislumbre da própria Águia.
A Águia é a fonte das emanações. Ela não possui nada de visual. O corpo inteiro do vidente sente a Águia. Há alguma coisa em todos nós que pode fazer-nos testemunhar com nosso corpo inteiro. Os videntes explicam o ato de ver a Águia em termos muitos simples: o homem é composto das emanações da Águia, e assim precisa apenas reverter aos seus componentes originais.
O problema surge com a consciência do homem; é sua consciência que se torna emaranhada e confusa. No momento crucial, no que deveria ser um simples caso de emanações dando conta de si mesmas, a consciência do homem é compelida a interpretar. O resultado é uma visão da Águia e das emanações da Águia.
Mas não existe Águia nem emanações. O que existe é algo que nenhuma criatura viva pode compreender. É designada de Águia, mas é simplesmente algo incognoscível, que se assemelha vagamente a algo conhecido. Por conta disso, houve tentativas de dotar as águias de atributos que não possuem. Mas isso sempre acontece quando pessoas impressionáveis aprendem a realizar atos que requerem grande sobriedade.
Há videntes de todos os tamanhos e formas. Há muitos imbecis que se tornaram videntes. Os videntes são seres humanos cheios de fraquezas, ou melhor, seres humanos cheios de fraquezas são capazes de tornarem-se videntes. Exatamente como no caso de pessoas deploráveis que se tornam grandes cientistas.
A característica dos videntes deploráveis é que eles desejam esquecer as maravilhas do mundo. Ficam maravilhados pelo fato de verem e acreditam que é seu gênio que conta. Um vidente deve ser um exemplo, capaz de ultrapassar a imprecisão quase invencível de nossa condição humana. Mais importante do que ver, é o que os videntes fazem com o que vêem.
Por conta do que alguns videntes fizeram, estamos presos a sua visão de uma Águia que nos governa e nos devora no momento de nossa morte. Essa visão no entanto, é imprecisa. Seria mais correto dizer que existe uma força que atrai nossa consciência, como um imã atrai limalha de ferro. No momento de nossa morte, todo nosso ser se desintegra sob a atração dessa força imensa.
Tudo o que pode ser afirmado por essas observações pessoais é que os filamentos de luz – dos quais são consituídos todos os seres e todas as coisas – são vivos e vibram, que existem tantos deles que o número não tem qualquer significado e que cada um deles é uma eternidade em si mesmo.