A Falsidade dos Manuscritos Cifrados da Golden Dawn

Por Frater Goya com colaboração de Kayque Girão
Sobre a Briga Crowley x Mathers

 

Há muita informação equivocada na internet a respeito de Crowley e Mathers, principalmente, apontando-os como inimigos mortais. No entanto, a história é um pouco diferente, e disponibilizamos aqui um pequeno artigo que ilustra isso.

Crowley defendeu Mathers de Yeats na briga sobre a chefia do Ísis Urânia, Templo mais importante da Golden Dawn em Londres à época.
O criador da cisma entre Mathers e Crowley que acontece posteriormente foi o Westcott (um dos membros fundadores da Golden Dawn). Existem inúmeras versões sobre uma batalha mágica envolvendo demônios entre ambos que deixou Londres 3 dias em trevas, mas sempre infundadas.
Quando começou o processo da Madame Hórus, que foi o que selou o destino da GD em 1902, Crowley escreveu a Westcott dizendo algo assim:
“Eu tenho grana pra limpar a barra e acabar com o processo. Basta o Mathers aceitar a minha proposta que tudo fica bem. Em troca, quero os manuscritos originais da GD (que ele ja havia copiado, como todos os membros faziam naquele tempo), em caso de negativa, eu publico o que ja tenho aqui anotado (o que acontece depois no Equinox). Nessa ocasião, Crowley já sabia da falsidade dos Manuscritos Cifrados, e queria expor Westcott.
Citação de Crowley em carta a Westcott —> “Caro Senhor e Irmão, (…) Permita-me recapitular (…) O senhor está ou esteve de posse (ou, melhor dizendo, incumbido) dos manuscritos cifrados sobre os quais as ordens de R.R. et A.C. e A.D. foram fundadas (…) Preservando a confidencialidade e a inacessibilidade desses manuscritos, o senhor tornou possíveis tais crimes e, consequentemente, tornou-se cúmplice (…) Portanto exijo que o senhor faça uma declaração clara dos fatos de como os manuscritos chegaram às suas mãos, e que os mesmos, apresentados através de tal declaração, sejam entregues aos Curadores do Museu Britânico (…) Assim, creio que nós dois poderemos provar sua autenticidade (…) Por essa ocasião, assim como agora, darei ao senhor total oportunidade de apresentar sua própria versão dos fatos (…) quanto às falsificações das quais seu colega o acusou (…) Se tal procedimento o desagrada, saiba que o senhor é o único culpado (…)” (págs 96-97)
Westcott viu ai a chance de se livrar de 3 coisas ao mesmo tempo
* A GD, porque ele ja tinha deixado a GD pela maçonaria e teosofia que eram mais aceitáveis socialmente, ja que ele era Coroner (Legista) da Coroa.
* Mathers, que era um falido e mal falado por causa das coisas da Golden Dawn, que naquela época já tinha sido vítima de inúmeros escândalos.
* E Crowley que pra ele sempre foi um problema.
O que Westcott fez? Não respondeu a carta e não passou ao Mathers.
Daí, crowley assumiu que Mathers virou as costas pra ele, e dai vem o lance do Equinox, guerra mágica, etc.
E porque Westcott faria isso? Especulo que foi ele quem forjou os manuscritos cifrados (existe ampla documentação disso, apresentado por Ellic Howe em “The Magicians of the Golden Dawn”). Ele usou o Mathers como laranja para dar legitimidade aos mesmos, a partir da tradução dele (Mathers) dos tais manuscritos, mas ele nao contava que isso viria à tona. Só que Yeats e mais uma turma, viram que tinha algo errado e começaram a investigar, chegando a descobrir que o Westcott mandava os manuscritos de Londres pra um amigo na Alemanha que mandava de volta em outro envelope. Obviamente, todas as cartas da Frau Sprengel já iam também escritas e assinadas. Então, ele sabia que ia estourar no rabo dele isso cedo ou tarde. Dai ele se bandeou pra Teosofia e largou o Mathers com a bomba. Mathers defendeu até o final (até porque ele também foi lesado e não queria acreditar que foi trouxa).
Aqui, seguem-se algumas citações que clareiam o entendimento do assunto:
“Os manuscritos criptografados, que mascaravam um texto totalmente em inglês, estavam escritos com tinta marrom em folhas de papel antigo, com marca d’água; de 1809 (…) elimina qualquer possibilidade de que o texto seja anterior a 1870, aproximando-o de 1880 (…) Westcott não fora esperto o suficiente para engendrar uma boa história sobre o manuscrito.” (pág.34)
“As dúvidas sobre as cartas de Sprengel e os manuscritos criptografados surgiram entre os membros da Ordem, mas não foram expressadas até 1900 quando Mathers, em uma carta (…) informava a Florence Farr que Westcoot: NUNCA teve contato, em qualquer época, tanto em pessoa, quanto através de comunicação escrita, com os Chefes Secretos da Ordem, ele mesmo tendo forjado ou mandado forjar a declarada correspondência entre si e os outros, e minha língua esteve atada todos esses anos devido a um antigo Juramento de Sigilo feito a ele, exigindo por ele, antes de demonstrar-me o que fizera e causara. Deve compreender, pelo pouco que digo aqui, a extrema gravidade de tal assunto e, novamente, peço-lhe, tanto para a segurança de Westcott quanto da Ordem, que não me force a dizer mais nada a esse respeito.” (pág.34)
“Westcott poderia ter-se defendido com mais veemência — possuía uma série de depoimentos ao aparente recebimento de cartas de Anna Sprengel e sua primazia na Ordem —, mas escolheu não fazer uso disso. Limitou-se a dizer a W.B.Yeats, designado para aproximar-se dele, que “falando legalmente, creio que não posso provar os detalhes da origem e conhecimento da história da Aurora Dourada, portanto, não seria justo nem prudente que endossasse suas opiniões sobre o assunto.” (pág.57)
“Mas por razões que nunca deixou claras (…) Westcott não fez uso desses depoimentos e recusou-se a defender-se das acusações de Mathers. Se ele tivesse rebatido as acusações de falsificação, voltando a ter um papel efetivo na Ordem, todo o furor, sem dúvida, teria se dissipado. Forçosamente, Mathers ainda teria sido rejeitado mas a Aurora Dourada teria permanecido intacta.” (págs 87-88)
Definitivamente, Westcott queria apenas defender a si mesmo, e queria se livrar tanto de Crowley como de Mathers, e a situação de 1902 ofereceu a oportunidade perfeita para isso. Westcott temia perder seu posto de Oficial da Coroa. Conforme podemos ver a seguir:
“Citação de Westcott em carta a Cadbury-Jones—> “Caro Cadbury-Jones, (…) Sei que M, disse a uma certa pessoa que duvidava da autenticidade de minhas cartas da Alemanha, assinadas Sap. Dom. Ast., mas não sabia que ele, na realidade, escrevera e enviara tal acusação de falsificação, nem tampouco sonhava que C. ouvira falar da acusação.
A citação de Crowley, sobre a verdadeira carta de Mathers dizendo que eu forjara correspondências não pode vazar. A acusação poderia ser repetida em qualquer matutino e o Conselho da Comarca de Londres poderia me procurar por acionar tanto M. por escrever e C. por editar o libelo e eu estaria arruinado.” (pág.93)
Os Manuscritos CifradosFolio_22Rascunho do RItual Menor do Pentagrama Folio 22.
Folio_48

Rascunho da Rosacruz Hermética Folio 48
Folio_53

Rascunho do Hodos Chamaleonis (o pré 777, de onde Crowley tirou a ideia para o seu famoso livro)
Sobre o Manuscrito Cifrado, ainda vale saber algumas informações extras:
(…) Westcott assumiu seu posto e conseguiu, com sua viúva, todos os documentos relevantes para o ritual, junto com alguns “papéis perdidos”. Esses eram, nada mais nada menos, o Manuscrito Cifrado” (pág.8)
“Portanto, a fim de Westcott satisfazer seu desejo de criar uma órdem esotérica atuante que oferecesse rituais assim como instrução (…) precisava criar algo inteiramente novo (…) Em março de 1888, Westcott finalmente produziu tal criação: a Hermética Ordem da Aurora Dourada” (pág.9)
“(…) mas esses são os fatos significantes: os manuscritos criptografados nas mãos dos primeiros adeptos, o suposto Templo de Hermanúbis e a autoridade dos primeiros adeptos alemães — embora a pergunta de como Westcott conseguiu os manuscritos e o que o levou à “Soror Sapiens Dominabitur Astris” (….) — foram assuntos de muitas e infrutíferas especulações. Quando pressionado, Westcott apresentou uma cópia de uma carta supostamente escrita pelo Reverendo A.F.A. Woodford (…) sobre a Preleção Histórica (…)” (pág.29)

Bibliografia:
Livro:

Revelações da Aurora Dourada (Golden Dawn) – O Esplendor de uma Ordem Mágica, de R.A.Gilbert, Editora Madras, ano (não informado), São Paulo.
The Magicians of the Golden Dawm, de Ellic Howe.

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