Por Donald C. Laycock
Tradução Frater Goya
Como os textos ditados em enoquiano consistem em uma série de “Chamadas”, ou invocações de seres sobrenaturais, era claramente necessário que Dee e Kelley soubessem como as palavras deveriam ser pronunciadas; na maioria dos sistemas mágicos, um pequeno erro no texto de um feitiço ou invocação é considerado como potencialmente causador de consequências desastrosas. Dessa forma, Dee tinha o hábito de escrever a pronúncia das palavras Enoquianas ao lado do texto. Se Kelley ditou as palavras letra por letra, ele deve ter fornecido a pronúncia da palavra inteira logo em seguida.
Para fazer essas observações sobre a pronúncia, Dee teve de improvisar com o alfabeto inglês comum; ele não tinha um sistema de notação fonética. Mas sua intenção geralmente é bastante clara. Ele escreve dg quando quer dizer “g suave” (como em gem); e s para “c suave”; e indica em alguns lugares que ch deve ser pronunciado como k. Ele assinala as vogais acentuadas na maioria das palavras. Às vezes – mas não com frequência – ele indica que uma letra deve receber sua pronúncia no alfabeto – assim, o ds deve ser pronunciado como “dee ess” e o z, em algumas circunstâncias, recebe a pronúncia “zod”. (A letra z nem sempre foi chamada de ‘zed’ ou ‘zee’; ela teve muitos nomes, entre eles ‘izzard’ e, no final do século XVI, ‘ezod’. “Zod” nada mais é do que uma variante desse último nome). Em casos mais difíceis, ele dá exemplos do inglês, assim, diz-se que zorge deve ser pronunciado para rimar com “George” e ul deve ser pronunciado “com o mesmo som em U que pronunciamos yew, de onde são feitos os arcos”, ou seja, ul é pronunciado como “Yule”.
Com todas essas instruções, podemos ter uma boa ideia de como o enoquiano soava para Dee e Kelley. É claro que temos de levar em conta o fato de que os dois homens falavam inglês de mais de quatro séculos atrás e também que, enquanto Dee veio das Midlands, Kelley veio de Worcestershire, em uma época em que as variações dialetais na Inglaterra eram maiores do que são agora. Felizmente, os linguistas dispõem de evidências suficientes – na forma de guias de pronúncia em livros escolares, rimas, erros de ortografia e coisas do gênero – para estabelecer a pronúncia da maioria das formas do inglês elisabetano com alto grau de precisão (trechos de Shakespeare, por exemplo, foram publicados em transcrição fonética, representando a pronúncia do próprio Shakespeare).
A pronúncia resultante do enoquiano faz com que ele soe muito mais parecido com o inglês do que parece à primeira vista. A tabela de letras e combinações a seguir oferece uma visão geral de como funcionava o sistema ortográfico do enoquiano:
Letra | Pronúncia |
A | longa (acentuada), como em lah-di-dah curta (sem ênfase), como em francês patte |
B | geralmente como o b inglês, mas silencioso entre o m e outra consoante, ou depois do m final |
C | como k antes de a, o, u (com algumas exceções) como s antes de i, e (com muitas exceções), e em grupos de consoantes (noncf= nonsf) |
CH | como k na maioria das posições, mas como ch finalmente |
D | como d em todas as posições |
E | quando acentuado, como no francês fee quando não acentuado, como em bed |
F | como f em todas as posições |
G | como g (forte) antes de a, o, u como j antes de i, e, na posição final, depois de d, e em grupos de consoantes |
H | como h na maioria das posições (exceto nas combinações ch, ph, sh, th); silencioso após uma vogal, mas a vogal é alongada |
I | quando acentuada, como em machine (francês) quando não acentuada, como em bit em combinações: ai como em fly; ei como em eight; oi como em boil como y na posição inicial da palavra antes de uma vogal (lad=Yad) |
K | como k em todas as posições |
L | como l em todas as posições |
M | como m em todas as posições |
N | como n em todas as posições |
O | quando acentuado, como em francês mot quando não acentuado, como em not em combinações: oi como em boil; ou como em bout; oo como em fool |
P | como p, exceto na combinação ph |
PH | como f |
Q, QU | como kw (qu em quick) – mas a palavra q é pronunciada kwa |
R | como r em right (mas pode ser enrolado) |
S | geralmente como s em sit às vezes z, em lugares onde isso é mais natural em inglês (lrasd=elrazd) |
SH | como sh em ship |
T | como t, exceto na combinação th |
TH | como th em thank |
U | como oo em boot, ou u em put em posição inicial como yew como v ou w antes de outra vogal, e na posição final da palavra |
X | como x em fox |
Y | como y na posição inicial de palavra antes de uma vogal como a letra i antes de uma consoante, e na posição final de palavra final |
Z | como z em zoo; em pouquíssimas palavras, como zod |
Deve-se observar também que os caracteres do enoquiano totalizam apenas 21, e não os 24 caracteres listados acima; C e K são expressos por uma única letra, assim como I e Y, e U e V. As 21 letras do enoquiano são, curiosamente, quase exatamente o mínimo necessário para escrever inglês sem nenhuma ambiguidade; talvez Dee estivesse interessado na reforma ortográfica.
Usando o guia de pronúncia acima, podemos transcrever o início da Chamada do Éter LIL (conforme apresentado adiante) em uma representação fonética aproximada:
Mádriaks di-es praf lil kis miká-olz sánir ka-ózgo od físis balzízras yaida. Nonsa gohúlim: míkma adóyan mad, yá-od bliórb, soba o-áona kis lusíftias pirípsol, di-es abrása nonsf netá-ib ka-ozji, od tilb adfát dámploz…
Como veremos em outro momento, o enoquiano adquiriu uma pronúncia muito diferente quando passou a ser usado em rituais mágicos do século XIX; mas, por enquanto, estamos preocupados com Dee e Kelley.
Donald C. Laycock
Canberra, Dezembro de 1978.