O Simbolismo do Dente

Por: Anderson Rosa (Frater Goya) frgoya@gmail.com

Para os Bambaras, os dentes dividem-se em três grupos: incisivos, caninos e molares. Os incisivos representam a nomeada e a celebridade, aparecendo em primeiro plano quando os lábios se abrem. Estão ainda relacionados à jovialidade e à alegria.

Perder os dentes é perder a força agressiva, a juventude e a defesa. É um símbolo de frustração, de castração. de falência. É a perda da energia vital, enquanto a mandíbula sadia e bem guarnecida atesta a força viril e confiante em si mesma.

O dente é um instrumento de tomada de posse, tendendo à assimilação: é a mó que esmaga para fornecer um alimento ao desejo. Os dentes simbolizam a força de mastigação, a agressividade devida aos apetites dos desejos materiais.

Os dentes significam a perfeição com a qual dividem o alimento que recebem; porque cada essência intelectual, tendo recebido em dom de uma essência mais divina a intelecção unificadora, divide-a e multiplica-a providencialmente para elevar espiritualmente, e tanto quanto possível, a essência inferior que tem a seu cargo.

Há também o princípio da magia homeopática, onde se troca dentes velhos por outros novos e melhores. Assim, em muitas partes do mundo é costume colocar os dentes extraídos em algum lugar onde facilmente possam ser achados por um rato ou uma ratazana, na esperança e que por intermédio da simpatia que segue existindo entre o dente e seu proprietário anterior, seus outros dentes irão adquirir a firmeza e excelência dos dentes dos ditos roedores. Por exemplo, na Alemanha é quase uma máxima universal entre as gentes que se deve colocar na cova de um roedor o dente extraído. Fazendo-o assim com os dentes de leite, evitar-se-á que a criança padeça de dores de dentes; também há que se colocar ante o lugar e arremessar para trás o dente dizendo: “Ratão, de-me seu dente de ferro; eu lhe darei o meu de osso”. Feito isto, seus demais dentes permanecerão sólidos.

A semelhança de conformação entre as extremidades orais e vaginais, como observa Roger Caillois, numa parte do mundo animal, é um fato devidamente estudado. Eis por que, muitas vezes, o desejo sexual é encarado como um aspecto da necessidade de alimentação. O próprio comportamento normal do ser humano atesta uma característica que representa o liame entre alimentação e sexualidade: “a dentada do amor”, por parte da mulher, no momento do coito. Refere-se o fato, ao que tudo indica, a um comportamento instintivo, sem nenhum caráter sádico. Tratar-se-ia, apenas, e inconscientemente, de um ato simbólico de devorar o macho.

No ser humano subsistem traços acentuados dessa convergência de instintos. No fundo, o homem receia ser devorado pela mulher. É o interior da vagina dentada, identificada com a boca, suscetível, por isso mesmo, de cortar o membro viril, no momento da penetração. O desenho da coletânea de poemas de Charles Baudelaire, Les Fleurs du Mal, que estampa uma mulher com a epígrafe Quaerens quem devoret, “buscando a quem devorar”, é muito sugestivo a esse respeito.

Trata-se, ao que parece, do complexo de castração. E é tal esse temor, que, na primeira noite de núpcias, nas culturas primitivas, o noivo era ou ainda é substituído por um estrangeiro, um prisioneiro de guerra ou por uma personagem importante, como o sacerdote ou rei. As duas primeiras classes eram escolhidas em função de seu pouco ou nenhum apreço e as duas últimas pelo fato de o sacerdote e o rei serem portadores da aura sagrada, não correndo, por isso mesmo, nenhum risco.

Explica-se, desse modo, o hábito que perdurou na França, até o séc.XIII, do célebre Le Droit de la cuissage du Seigneur, ou seja, o direito da coxa do senhor, em que o rei, deflorando a noiva, dizia-se, prodigalizava às mulheres a fertilidade, bem como contribuía poderosamente para a prosperidade do rebanho e para colheitas abundantes. Como se vê, sexualidade ligada à alimentação. Aliás, o verbo comer em nossa língua tem, além de seu sentido normal, uma conotação chula.

Será que o ser humano mudará em função de sua evolução dentária?

A linha da Terapia Corporal nos diz que mostrar os dentes é uma atitude de agressividade, assim como fazem o cão e outros animais quando se encontram. Desta forma, podemos dizer que o sorriso, mais que cordialidade é uma forma de defesa contra o outro.

Segundo as teorias mais modernas da evolução dentária, percebe-se que os dentes estão mudando de forma e função com o passar do tempo. Por exemplo, o dente do ciso já perdeu a sua função e atrofiou-se de forma a se tornar até mesmo um estorvo, e nas gerações mais novas já deixa de marcar presença em alguns casos.

Restam-nos ainda algumas perguntas: Será que o ser humano mudará em função de sua evolução dentária? Esta evolução será apenas alimentar, ou também comportamental? No caso de ser comportamental, qual será o comportamento das próximas gerações?

Link permanente para este artigo: https://cih.org.br/?p=16